Filme novo do Almodóvar

Os amantes passageiros, que está em cartaz aqui no Rio, pode parecer uma comédia leve, mas pra mim não foi. Calma que eu não vou contar a história, só o enredo, para vocês conseguirem me entender.

Um grupo de aproximadamente 10 pessoas está confinado numa situação de risco – no caso, o principal se passa entre a classe executiva e o cockpit de um avião. Em sua maioria, numa olhada de relance, são espécimes do pior que existe em termos de ser humano. Há uma cafetina, um banqueiro golpista, um assassino de aluguel, um traficante de drogas, um ator volúvel e uma vidente. Há também cinco “homens trabalhando” – três no serviço de bordo, o piloto e o co-piloto, todos às voltas com sua opção de gênero. Mas cada um lida do seu jeito com o assunto. Tem a bichinha devota que não come ninguém. Tem o co-piloto que reluta em assumir sua bissexualidade. Tem o casal piloto + o chefe dos comissários (esqueci como se chama a função… e fiz curso de aeromoça, mas tem muuuuito tempo…) Tudo temperado a muito álcool, droga e performance no melhor estilo cabaré gay. A doçura das três “comissárias” já vale o filme (e pensar que já houve tempo em que os homossexuais tinham que ser “machos” como Madame Satã para sobreviver, que bom que isso acabou!).

Cada personagem tem lá o seu nó na vida. Temendo o pior, que seria a morte num acidente aéreo, começam a desatar os problemas e… não posso contar o fim. Mas eu não vi ali comédia não. Há diferença entre forma e conteúdo. Almodovár nos premia com uma história que é essencialmente otimista. Mesmo o pior dos dramas tem jeito. É isso que, de uma forma engraçada, quase inocente, de tão honesta, os personagens nos oferecem, dentro da sua imperfeição. A gente se apaixona por cada um e, mais ainda, pelo seu criador.

E ainda resta a metáfora: não seríamos todos nós, sempre em busca da realização romântica, no fim apenas amantes passageiros uns dos outros? Fica a pergunta no ar.