Agente Duplo

Ainda convalescendo de uma virose maluca que me pegou no domingo – tenho a mesma doença uma noite por ano, todo ano, há uns cinco anos… – acabei assistindo a um filme chileno chamado Agente Duplo. O motivo que me fez optar, depois de ver a chamada algumas vezes na TV aberta, foi o fato de o ator principal ser muito parecido com o escritor Thomas Mann, que eu adoro. Eu não tinha entendido muito a proposta, mas depois fez sentido.

Embora eles não se denominem como docudrama, mas sim como documentário, fica claro que houve uma mistura de encenação com registro real. O mais bacana é que a gente não consegue delimitar onde começa uma e outra coisa. Se aquele velhinho de 84 anos, que ainda por cima tem o nome do meu pai, Sérgio, é realmente aquela fofurice toda, quero roubar ele pra mim!!!

Depois de ficar viúvo, Sérgio responde a um anúncio de jornal (impresso, obviamente) que procura um homem entre 80 e 90 anos. Ele se candidata, assim como outros senhores, para fugir da paradeira da rotina. Tem que se infiltrar num asilo para reunir provas caso uma senhora, cuja filha contratou um detetive, esteja sendo maltratada, como a contratante desconfia.

Neandertais que só consideram a possibilidade de assistir a filmes cheios de explosões e perseguições de carros, goelas cortadas e tudo o que compõe o gênero (gênero?) de ação não aguentariam assistir cinco minutos. Almas mais espiritualizadas e/ou avançadas em anos, como eu (estou falando da idade, não sei em que degrau da escada evolutiva me encontro) vão se identificar com a perspectiva da entrada na terceira idade e a pergunta que vem dos tempos remotos: haverá uma quarta idade? ainda que no outro mundo?? será???

O recado do filme é para os menos idosos cuidarem dos mais idosos. E eu me vi transportada para asilos reais, onde encontrei pessoas próximas, e conheci outras vovós e vovôs, e entendi perfeitamente do que eles ali estavam falando. A mim ocorreram pensamentos díspares, do tipo: acho que vou me mudar para o Chile! Mesmo não tendo tido filhos, será que ainda vão me chamar de vovó??Será que consigo dar um jeito de envelhecer sem ficar inválida, física, emocional e mentalmente??? E se eu ficar apenas fisicamente ruim, mas com a cabeça boa, não será pior????

Se você, pelo tema, concluiu que Agente Duplo é um filme triste, não é não! As cenas em que o detetive ensina Sérgio a usar os recursos midiáticos do celular são muito engraçadas.

Fui ver o Divertida Mente

Sessão dublada e em 3D, sala cheia de crianças, e o jeito Pixar de fazer filmes, com um bônus inicial – uma história de amor entre dois vulcões. Gostei do filme, que mostra ora uma disputa, ora a colaboração entre as emoções de uma menina, embora tenha quase cochilado em alguns trechos e apesar de um defeito na projeção (a imagem sumiu!), que obrigou a exibição a retroceder alguns minutos. Mas achei o filme muito sério mesmo. Não só por ser pouco engraçado como, também, por tratar de temas um tanto profundos. Saí do cinema com uma sensação meio estranha que ainda não identifiquei. Talvez leve ainda mais algum tempo para eu descobrir do que se trata, se é que eu vou conseguir.

Vale ver novo filme de Al Pacino

Não olhe para trás. A boa recomendação é também o nome em português do novo filme de Al Pacino, dirigido por Dan Fogelman. Apesar de apresentar temas pesados – os abusos sofridos e os promovidos pelos astros da música, câncer, pai que abandona filho… – é tratado com tanta leveza e otimismo que se torna uma aula de como “dar a volta por cima” diante dos obstáculos que, de uma forma ou de outra, todo mundo precisa encarar.

Já dei detalhes demais e não quero estragar o deleite de quem for assistir. Mas pode ter certeza de que você vai ver um filme bonito sobre amizade, sensibilidade, vontade de viver, ternura. E com a trilha sonora cheia de canções bacanas do John Lennon. A história é baseada em fatos reais. Ela contribui bastante para mostrar o ponto de vista do artista diante da vontade do seu público, que pode ser bem dramática.

O protagonista queria se reciclar, mostrar novas canções, mas o público queria sempre ouvir mais do mesmo, como no caso que recentemente abriu uma crise entre Ed Motta e o público brasileiro. Mas eu até que entendo o lado deles. Dinheiro não paga tudo e isso significa dizer que não é porque a gente compra os discos, vai aos shows, que passa a ter direito de determinar o que o sujeito vai cantar naquele dia. Ser fã está bem longe de ter a posse do trabalho intelectual e, mais ainda, emocional do seu ídolo. Portanto, é abusivo, sim, chegar num show e ficar berrando o nome da música que você quer ouvir. Assim como era abusivo o que faziam com o Renato Aragão, nos aeroportos da vida: faz uma palhaçada aí pro meu filho, diziam os pais das crianças. Quanta falta de respeito!

Cinema para quem?

Tinha combinado um cinema com amigas para ontem, e como duas delas moram bem perto da sala de exibição, uma ficou de ir comprar os ingressos com antecedência. Coube a mim ver no jornal os horários da sessão e ligar pra ela, ainda antes do meio-dia. Quase caí para trás ao ver que O Globo não publica mais o serviço que, a minha vida inteira, servia para informar os locais e tudo mais que a gente precisasse para se organizar. Agora existe uma espécie de coluna comentando poucos filmes e, logo abaixo, um box dividido em dois campos: no primeiro, mandam você ir conferir as sessões pelo celular, usando um QR Code; no outro, apenas chamam você para ir ver a programação completa na página do jornal na internet. Decretaram o fim de uma era. Agora, para poder ir ao cinema, você tem que ser informatizado. Se não, não vai.

Filme novo do Almodóvar

Os amantes passageiros, que está em cartaz aqui no Rio, pode parecer uma comédia leve, mas pra mim não foi. Calma que eu não vou contar a história, só o enredo, para vocês conseguirem me entender.

Um grupo de aproximadamente 10 pessoas está confinado numa situação de risco – no caso, o principal se passa entre a classe executiva e o cockpit de um avião. Em sua maioria, numa olhada de relance, são espécimes do pior que existe em termos de ser humano. Há uma cafetina, um banqueiro golpista, um assassino de aluguel, um traficante de drogas, um ator volúvel e uma vidente. Há também cinco “homens trabalhando” – três no serviço de bordo, o piloto e o co-piloto, todos às voltas com sua opção de gênero. Mas cada um lida do seu jeito com o assunto. Tem a bichinha devota que não come ninguém. Tem o co-piloto que reluta em assumir sua bissexualidade. Tem o casal piloto + o chefe dos comissários (esqueci como se chama a função… e fiz curso de aeromoça, mas tem muuuuito tempo…) Tudo temperado a muito álcool, droga e performance no melhor estilo cabaré gay. A doçura das três “comissárias” já vale o filme (e pensar que já houve tempo em que os homossexuais tinham que ser “machos” como Madame Satã para sobreviver, que bom que isso acabou!).

Cada personagem tem lá o seu nó na vida. Temendo o pior, que seria a morte num acidente aéreo, começam a desatar os problemas e… não posso contar o fim. Mas eu não vi ali comédia não. Há diferença entre forma e conteúdo. Almodovár nos premia com uma história que é essencialmente otimista. Mesmo o pior dos dramas tem jeito. É isso que, de uma forma engraçada, quase inocente, de tão honesta, os personagens nos oferecem, dentro da sua imperfeição. A gente se apaixona por cada um e, mais ainda, pelo seu criador.

E ainda resta a metáfora: não seríamos todos nós, sempre em busca da realização romântica, no fim apenas amantes passageiros uns dos outros? Fica a pergunta no ar.

Belo retrato da condição humana

Baz Luhrmann fez sua versão de O Grande Gatsby bem parecida com sua versão de Moulin Rouge. Nos dois casos, um narrador nos conta uma história triste e, no meio do enredo, vemos imagens da multidão festejando como se fosse o último dia da vida. Seria coincidência ou estaremos diante da visão do autor do que anda se passando no mundo? De qualquer forma, além da atuação magnífica dos atores, O Grande Gatsby tem vários méritos. Como o de fazer você ter vontade de ler o livro de Scott Fitzgerald.

Eu não vi na tela uma história de amor, como se poderia pensar pelas imagens do trailler. Vi uma história de amizade entre o narrador e o protagonista. Imaginei que o narrador possa ter sido, em parte, o próprio escritor, em algum momento da vida. Gritante é o seu desprezo pela mesquinhez humana, pela falta de nobreza dos sentimentos, pela forma como os interesses pessoais, inclusive de gente considerada respeitável, destroem despudoradamente a vida alheia. Mais atual, impossível.

O vampiro do Tim Burton

Sábado passado fui assistir ao Sombras da Noite, com Johnny Depp no papel de Barnabas Collins, o cara que vira vampiro. Depp conseguiu manter a dignidade num filme que, cá pra nós, tem alguns méritos, mas não pode ser chamado de bom. Michelle Pfeiffer está ótima também, a fotografia é bacana, a trilha sonora anos 1970 é muito gostosa, mas… que roteiro tão fraco! Pra vocês terem uma noção, do que eu mais gostei foram os cabelos das atrizes. Tem Oscar pra isso? Eles deviam levar.

Ancestrais

Agora falta pouco para terminar a leitura de A Viagem de Théo, sobre o qual já falei aqui. O personagem está no continente africano e descobre a importância que tem o culto aos ancestrais na vivência religiosa de diversos grupos de lá. Os rituais a serem cumpridos mesmo anos após a morte de um parente. As oferendas de alimentos que, aliás, estão presentes também na cultura japonesa, segundo li anos atrás numa revista sobre religião.

Mesmo para quem não tem crença, a relevância dos espíritos dos mortos é convincente a ponto de servir de solução dramatúrgica e posso citar pelo menos dois exemplos de sucessos na literatura e/ou no cinema, ou seja, produtos de consumo de massa. Na trilogia de O Senhor dos Anéis, há uma batalha arriscada que só é vencida pelos heróis quando eles invocam a ajuda de exércitos de mortos. Na mais recente saga em série de Piratas do Caribe idem. Desculpem não dar mais detalhes, mas minha memória é realmente ruim e já faz um tempo que assisti a um e outro. Os fãs de plantão que se lembrarem do que estou falando podem ajudar mandando detalhes das respectivas cenas aqui para o blog.

Lembro que, na época da segunda recorrência, cheguei a comentar com minha falecida mãe. Pena não me recordar mais do comentário que ela fez a respeito. Dona Magdalena era uma mulher bastante espiritualizada e com um canal permanentemente aberto junto ao mundo invisível. Recentemente, diante de crises pessoais que não posso entender, e também da inexistência – em que não cabe recurso – de uma descendência, às vezes me pego pedindo a ajuda dos meus ancestrais. Se formos contar pelo menos nossos país e avós, já é uma meia dúzia de boa vontade na torcida.

Balancinho de cinema

Como não posso ficar em casa, ontem e anteontem minha saída foi ir assistir ao que anda em cartaz. Recomendo o novo do Sherlock Holmes, tem ritmo e charme. Mas As aventuras de Tintin eu poderia ter deixado passar. Creio que Spielberg deva ter algum laço afetivo com o personagem, o que justificaria o investimento para a produção do filme. O enredo é pueril e chega a ser de um anacronismo flagrante, o que faz contraponto com a tecnologia de animação utilizada. O que eu quero dizer é que a história é bobinha para a modernidade e o Tintin, de tão perfeito, me fez lembrar o chato do Mickey Mouse.

Mas me deixem confessar também minha ignorância: a vida inteira eu acreditei que Tintin fosse o cachorro (tinha outro Tintin na tv). E olha que, por vezes, é ele, sim, quem parece o protagonista. Desculpem, fãs, mas não irei assistir à continuação, insinuada na cena final.